Véspera das eleições na Venezuela



Relato do 3º dia (13/04/2013) do camarada Alexandre Mandl, enviado da Campanha "Tirem as Mãos da Venezuela" a Caracas:

A eleição é amanhã! Mas a discussão já é pós-eleições... entre conciliação e modelos, rompamos com o reformismo e a burocracia para aprofundar a revolução!

Ontem e hoje o clima é de ansiedade para a eleição de amanhã, domingo. Há tensões diante do assassinato de um trabalhador da PDVSA após a manifestação de quinta-feira, bem como da descoberta do plano de desestabilização realizado pela burguesia venezuelana junto com a CIA e com mercenários da Colômbia e El Salvador, que foram descobertos e presos.

Junto a isso, o clima estava quente por conta do anúncio de que Capriles não reconheceria o resultado. A pressão foi tremenda, inclusive do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) (Justiça Eleitoral) e dos representantes e observadores internacionais, e Capriles recuou, dizendo ontem que o povo venezuelano deverá ser o grande vencedor das eleições, pela unidade da pátria, seja qual for o vencedor.

No entanto, essa declaração já sinaliza duas coisas: uma é a provável derrota. E segundo, como consequência, é que Maduro discurse em prol da unidade e pela reconstrução da divisão criada por Chávez. Capriles e a direita tem insistido nisso ontem e hoje.

Maduro, entretanto, deu uma ótima resposta quando perguntado se a Venezuela estava dividida, etc. Ele responde, fugindo da provocação feita, dizendo que sim! A Venezuela está dividida desde 1492, quando chegaram os espanhóis. E aí começou fazendo um retrospecto histórico mostrando como houve a divisão social na Venezuela. Longe de uma compreensão eminentemente marxista, mas claramente uma análise que procurou mostrar que essa divisão social é historicamente construída, e que, com Chávez, a polarização ficou extremamente maior, diante das diferentes perspectivas de governo e de organização popular.

Maduro não é Chávez. E o desafio que virá é enorme. Passado o clima ainda de comoção com Chávez, e isso pode durar 1-2 anos, ou pode durar mais, isso ainda não há como prever, Maduro será alvo das provocações mais reacionárias, mas, essencialmente, das tentativas de cooptação e aliança, buscando que Maduro trave o processo. Isso provocará reações nas relações com as massas, que não aceitarão recuos e lutarão para avançar suas conquistas sociais. Sem Chávez, que tinha o poder de conter os próprios anseios de avanço, o processo revolucionário poderá avançar ao socialismo, com expropriações dos grandes bancos e empresas.

Como líder sindical, operário, com grande conhecimento das questões internacionais, escolhido a dedo por Chávez, Maduro não é um “poste” como tentam mostrá-lo, como um simples sucessor de Chávez. Suceder Chávez não é algo fácil, mas, aos poucos, deverá dar um pouco de “sua cara”, e apesar de erros criminosos cometidos, como a entrega de um militante de direitos humanos exilado da Colômbia, e vacilos enquanto Ministro de Relações Exteriores, Maduro é visto como um ponto de apoio dos trabalhadores, da luta operária e que sempre se interessou pelas questões do controle operário.

Agora, a questão que mais tem me parecido ser central é justamente os movimentos de tentativa de conciliação que virão depois da eleição. Isso porque, lembremos o que já disse aqui antes, do papel do Brasil e de Lula para a Venezuela. Lula recomendou e o aconselhou a fazer alianças mais amplas como forma de superar as dificuldades que virão sem ter Chávez. Nós dizemos que, justamente por isso, ele terá que se apoiar na classe trabalhadora e na juventude, e avançar nas expropriações para construir o socialismo.

Interessante é como Capriles também tem se utilizado do “modelo brasileiro”. Perguntado num debate ontem, ele reforçou o que disse durante toda a campanha. De que não é de esquerda ou de direita, mas é um progressista, e que se for para dizer qual referência possui, diz que pretende seguir o que Lula e Dilma fizeram, tirando 30 milhões da pobreza, “uma Venezuela”, como ressalta, inclusive afirmando que Chávez não fez isso. Afirma que diferente da Venezuela, Brasil é bem visto internacionalmente, tem relações com todos os países, não possui agressividade nas relações exteriores, etc etc etc.

Tenho dito para as pessoas que isso é determinante. O papel do Brasil para a América Latina é importante para pensar a construção do socialismo e da luta dos trabalhadores em todos os países do continente. Mas impressionante é ver como o governo Lula e Dilma, que caracterizamos como um governo de contenção de classe no Brasil, também é a referência de um governo de contenção de classe em todo o continente. Já tinha ouvido isso pessoalmente no Paraguai, na Argentina e agora, aqui, ganha novas proporções. É um perigo... Capriles reivindicando o governo Lula como exemplo, cabe a todos algumas reflexões... e que sirva ao próprio Maduro e ao povo venezuelano para que percebam as armadilhas do significado dessa associação de Lula/Dilma e do Brasil como um paradigma de progresso e transformação social.

Maduro, apesar de muitos vacilos, ontem fez uma declaração que reafirma que cumprirá o “dever cívico prometido à Chávez de aprofundar o socialismo”. Caberá utilizar esse “dever cívico” para debatermos e atuarmos na prática o que é esse socialismo e quais os passos a serem dados. E aí a seção venezuelana da Corrente Marxista Internacional cumpre um importante papel, justamente por ter claro o programa a ser desenvolvido. Da mesma forma, os trabalhadores da Frente Bicentenaria de Fabricas Ocupadas, com diferentes experiências de luta pela nacionalização sob controle operário, devem seguir firmes, consolidando a visão, que aqui já se generalizou, dos erros e limites das cooperativas, mas que deverá enfrentar as armadilhas criadas pelas chamadas empresas de propriedade social.

Na próxima semana já marcamos de eu conhecer mais de perto essa realidade, e escreverei sobre isso.

Por ora, fiquemos com a ansiedade das eleições de amanhã, contando que sejamos vitoriosos, estamos com Maduro, e, depois, estejamos juntos à base, impulsionando rumo ao socialismo e às expropriações, seguros de que enfrentaremos a burguesia, mas, essencialmente, a burocracia e os reformistas.

Nenhum comentário: